Os desafios emergentes na Educação do (e para) o Séc. XXI
E Estamos a viver momentos cruciais para a Educação em Portugal, não só na sua orgânica, que tem sofrido inegáveis reajustes, essencialmente por decreto, mas sobretudo porque urge clarificar que competências queremos nós desenvolver nas nossas crianças e jovens, que práticas teremos que implementar a curto médio prazo, sob pena de perdermos o “comboio dos tempos”…
Neste sentido, o Perfil dos Alunos à Saída da Escolaridade Obrigatória, documento emanado pelo Ministério da Educação, configura-se como o mais importante contributo para esta necessária reflexão. Sendo um referencial de competências, terá a capacidade de induzir inovação e mudança? Será capaz de mobilizar e apaixonar todos quantos irão colaborar na sua aplicação futura? Sendo um referencial norteador do ensino em Portugal, que benefícios vamos obter? Que diferenças poderemos ver na qualidade das aprendizagens num futuro próximo ou longínquo?
Consideramos que seria de todo pertinente, antes de mais, perceber que futuro será este, que desafios nos serão colocados, que características terá este mundo em permanente mudança…
A resposta a estas questões são, na nossa opinião, o garante de encontrarmos fundamentos sólidos para a tão desejada e premente mudança! A não clarificação das competências que os jovens devem possuir, para o cidadão comum, para os jovens estudantes e seus pais, e porque não para muitos professores, poderá constituir o maior entrave na pretensão de estabelecer um referencial de competências que pretenda conquistar todos os atores do sistema educativo para um projeto de mudança.
Para não corrermos o risco tornar demasiado extensiva a análise às inúmeras dimensões do ser humano e das suas relações com o mundo, centremo-nos apenas nas questões do emprego, deixando de parte outras dimensões igualmente importantes. Quando perspetivamos as características do Séc. XXI, não podemos descurar a proliferação de empregos ligados à inteligência artificial, às engenharias, à matemática, à robótica, à automação, às nanotecnologias, muito menos a previsão de uma invasão do mercado de trabalho global, que tornará alguns milhares de empregos, simplesmente, obsoletos para não dizer extintos. Consideremos ainda que, segundo alguns estudos, cerca de 40% das empresas e organizações mundiais não veem satisfeitas as suas reais necessidades; a natureza dos empregos sofre uma alteração profunda e ainda que se verifica uma generalização do subemprego dos jovens licenciados. Queiramos ou não, estas são algumas das características do mundo em que as nossas crianças e jovens se integrarão, onde terão de se diferenciar e afirmar como mais-valias se quiserem encontrar a sua plena realização.
Por isso se justifica que sejam claramente explicadas as relações entre os desafios civilizacionais do Séc. XXI e as competências que as crianças e jovens deverão possuir se quiserem escapar, ao longo da vida, ao estatuto de precários, subempregados,…Sendo o nosso sistema de ensino vinculado, maioritariamente, com o propósito de produzirem funcionários uniformes, rotineiros, dependentes, como iremos transformá-los em cidadãos autónomos, afirmativos, inovadores, críticos e solidários? Que competências deverão ter para, quando especializados numa área que se torna obsoleta, se reconfigurarem para outra, radicalmente distinta? E para lidarem com a incerteza que caracteriza os nossos dias? E para decidirem em situações não-lineares, de grande complexidade e indeterminismo? E para liderarem e saberem ser liderados? E para interiorizarem, pela prática, que muitos dos sucessos dos nossos dias se encontram para lá de grandes derrotas e frustrações? E para se apaixonarem pelas tarefas que executam? E para assumirem autonomamente os seus destinos, tornando-se cidadãos proativos? A nosso ver, a resposta a estas questões não se encontra plasmada claramente no Perfil do Aluno à Saída da Escolaridade Obrigatória, mas é, sem dúvida, um excelente contributo na resposta a estas preocupações.
No sentido de ir ao encontro do tema central deste artigo, “Os desafios emergentes na Educação do (e para) o Séc.XXI”, não poderíamos deixar de fazer uma pequena incursão por um tema amplamente discutido, mas que carece de esclarecimento…isto porque, no centro de todas estas questões, estão em causa as competências necessárias e emergentes para enfrentar a sociedade do Séc.XXI. Desde logo, entender competências numa sociedade em que se fala sobretudo de conhecimentos, conteúdos e disciplinas, é uma tarefa árdua e que poderá criar conflitos de comunicação. Para melhor perceber o que aqui está em questão, voltemos às questões relacionadas com o “mundo dos empregos atuais e futuros”… Quando um empregador realiza uma entrevista de emprego, procura aferir o que realmente sabe fazer o candidato, preocupando-se muito menos com os seus conhecimentos. Isto porque, o senso comum indica- nos que, geralmente, nem sempre quem possui muitos conhecimentos os consegue colocar em prática. Por outro lado, nem todas as competências se relacionam com conhecimentos. Muitas das competências mais valorizadas nos dias de hoje em nada se relacionam com conhecimentos, tais como a curiosidade, iniciativa, persistência, resistência à frustração, adaptabilidade, liderança, proatividade,… Por último, há que considerar o desfasamento existente entre o mercado de trabalho, os perfis de competências que os empregadores valorizam e procuram e os perfis de competências que a Escola desenvolve na sua globalidade.
“Muitas das competências mais valorizadas nos dias de hoje - a curiosidade, iniciativa, persistência, resistência à frustração, adaptabilidade, liderança, proatividade - em nada se relacionam com conhecimentos.”
No nosso entender, torna-se claro que os desafios emergente na Educação do (e para) o Séc. XXI se encontram ao nível da (re)definição de competências a desenvolver pelo sistema educativo tendo como objetivo a integração total das nossas crianças e jovens no mercado de trabalho e da vida adulta. Estas terão que ter um caráter transversal, abarcando mais do que um domínio; multidimensional, incorporando saberes, aptidões, atitudes e valores; e indutoras de comportamentos de ordem superior quando aplicadas à resolução de problemas em situações complexas ou de elevada incerteza.
Tendo estes pressupostos em mente, o Centro de Educação Integral desenvolveu um Perfil de Aluno do CEI, perfil que procura responder aos desafios da sociedade, que integra os Perfil de Aluno à Saída do Ensino Obrigatório, que tem em conta os estudos já realizados um pouco por todo o mundo, sem descurar a sua identidade enquanto escola para a vida!
Não querendo tornar esta análise exaustiva, exploraremos os grupos de competências que assumimos como a base do nosso perfil de aluno, terminado o 12.º ano, mas que pretendemos desenvolver, faseadamente e com as devidas adaptações, em todos os níveis de ensino.
As vinte e oito competências que definimos como fundamentais na construção de cidadãos comprometidos e implicados com o mundo agrupam-se em quatro grupos: Competências Cognitivas, Competências de Aprendizagem, Competências Socio Emocionais e Competências de Liderança.
Como “Competências Cognitivas”, entendemos as que mais comummente estão relacionadas com o conhecimento e com as capacidades em o aplicar. Assim, encontramos competências como a comunicação, o raciocínio lógico dedutivo e científico, digitais, o domínio do corpo, bem-estar e saúde, a sustentabilidade e ambiente, a identidade cultural e a sensibilidade artística.
No que respeita às “Competências de Aprendizagem”, valorizamos as que são necessárias para uma efetiva relação de sucesso entre o conhecimento real e a sua apropriação pela criança/jovem. Deste modo, são fundamentais as competências do aprender a aprender, a inovação, o pensamento crítico, pensamento sistémico, a priorização, a resolução de problemas e a abertura ao mundo.
Outro grande grupo de competências que consideramos são as “Competências Socioemocionais”, que se entrelaçam intimamente com as restantes, sendo hoje reconhecidas como fortes indutores de sucesso, isto é, quase que determinam antecipadamente o sucesso de quem as possui e o insucesso de quem não as desenvolve e cultiva. Assim, valorizamos o respeito e valorização do outro, a gestão de conflitos, o benefício mútuo, a integridade, a cidadania ativa, a sinergia e a inteligência emocional.
Por último, mas não menos importante, destacamos as “Competências de Liderança”, que serão tão necessárias aos jovens de hoje para poderem enfrentar a sociedade sem se encontrarem numa postura passiva e de dependência face ao outro. Neste grupo, consideramos essenciais a autonomia, a visão, a iniciativa, a resiliência, a flexibilidade, a proatividade e o equilíbrio e bem-estar.
Cada uma destas vinte e oito competências necessitaria de uma maior explicação, enquadramento e, algumas delas, seriam motivo de uma dissertação, só versando sobre o que significam. Não sendo de todo possível fazê-lo neste artigo, fica um contributo para o início de um debate que se pretende construtivo em torno destas questões.
Reflexão - Professores 1º ciclo
in CEI Descobrir, nº 23 | 2018/2019